ENTRETIEN EN PORTUGAIS SUR LA DIETE MEDITERRANEENNE
Jean Louis Peytavin, journaliste au Brésil, m’a donné l’autorisation de mettre en ligne sur ce blog ce texte correspondant à un entretien qui sera présent sur quelques sites brésiliens. J’espère que cela pourra aider quelques visiteurs qui ont plus de facilités en portugais qu’en français. Bonne lecture !
Il y a une traduction (provisoire) de ce billet faite par Keith (on la remercie beaucoup).
ENTREVISTA
Michel de Lorgeril e a dieta do Mediterrâneo
Cardiologista e especialista em nutrição, Michel de Lorgeril trabalha em um laboratório do CNRS (Centre National da Recherche Scientifique) da Universidade de Grenoble/França.
Nos anos 1990, ele ajudou a divulgar a dieta do Mediterrâneo, após a publicação do Estudo de Lyon (Lyon Diet Heart Study).
Desde então Michel de Lorgeril publicou inúmeros trabalhos e livros sobre a nutrição e a proteção cardiovascular, e sobre outros temas ligados como o álcool, o colesterol, o “paradoxo francês”, sem medo das polêmicas.
Ele defende que medidas simples de mudança da alimentação são indispensáveis e suficientes para prevenir a maioria das doenças cardiovasculares e que a ênfase dada à luta contra o colesterol (e aos medicamentos anticolesterol) é errada.
As pesquisas do Dr Michel de Lorgeril mostram claramente a complexidade, as contradições e as implicações socioeconômicas da pesquisa científica na área da saúde no mundo de hoje.
Nutrição Brasil – Como decidiu estudar a dieta do Mediterrâneo quando iniciou seus primeiros trabalhos sobre o tema da nutrição e coração?
Michel de Lorgeril – Comecei a estudar a relação entre nutrição e doenças cardiovasculares quando trabalhei no Hospital Universitário de Geneva, Suíça, nos anos 1980, sobre o tema das plaquetas e da trombose. Percebi que a alimentação tão peculiar dos Esquimós tinha consequências importantes em termos de trombose e hemorragia. Procurei entender então a relação entre nutrição e trombose e me interessei pela teoria da dieta do Mediterrâneo. Fizemos um acordo com uma equipe do Inserm de Lyon (Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale), dirigida por Serge Renaud, para realizar uma intervenção randomizada, da qual fui o principal investigador.
NB – A dieta do Mediterrâneo inclui uma variedade de tradições culinárias, desde a Grécia, a Itália, a França até os países da África do Norte. Quais são os grandes princípios que juntam todas essas cozinhas?
ML – A variedade culinária é real, mas, em termos científicos, quando raciocinamos em nutrimentos e não em alimentos, podemos perceber que há uma grande homogeneidade nos hábitos tradicionais dos povos mediterrâneos.
Por exemplo, se limitamos nosso raciocínio aos lípides, pode se afirmar que a dieta do Mediterrâneo tradicional é caracterizada por:
1) consumo reduzido de gorduras saturadas animais ou vegetais;
2) consumo elevado de gorduras monoinsaturadas vegetais;
3) consumo reduzido de gorduras monoinsaturadas animais;
4) consumo reduzido de gorduras poliinsaturadas omega-6 animais ou vegetais;
5) consumo elevado de gorduras poliinsaturadas omega-3 vegetais e animais;
6) ausência de consumo de ácidos graxos trans industriais.
Essa descrição é um pouco rebarbativa, mas é a única que é exata do ponto de vista científico e que permite uma conceitualização desses hábitos nutricionais.
NB – Se o cuscuz da África do Norte é um exemplo de receita mediterrânea, quais são as características que fazem dele uma refeição ideal do ponto de vista da dieta do Mediterrâneo?
ML – O cuscuz é um prato completo, independentemente de seu caráter mediterrâneo: tem boas proporções de açúcares lentos (cereais), de legumes, de proteínas (vegetais e animais) e de gorduras animais e vegetais. Ele foi ideal nos países e nas épocas em que a subnutrição era o problema principal.
NB – No seu primeiro estudo, você utilizou uma margarina de óleo de canola como fonte de ácidos graxos omega-3. Porque escolheram este óleo?
ML – A canola (óleo e margarina) foi empregada como substituto da manteiga (que era “proibida” aos pacientes do grupo experimental) ou do azeite quando os pacientes não queriam usar este óleo. A canola tem a vantagem de ter uma composição em ácidos graxos próxima a do azeite, com omega-3 em mais.
NB – O óleo de canola é rico em ácido alfa-linolénico (ALA), enquanto que os peixes graxos são ricos em ácido eicosapentaenóico (EPA) e ácido docohexaenóico (DHA). O que sabemos hoje sobre os interesses respectivos desses diferentes ácidos graxos omega-3 e sobre sua absorção? Quais são as recomendações para o consumo?
ML – Algumas populações do Mediterrâneo consomem pouco EPA e DHA (quer dizer pouco peixe graxo), mas, no entanto, são protegidas. Ainda mais, suas taxas sanguíneas de EPA e DHA não são elevadas, mas não são insuficientes. De fato, e ao contrário do que afirmam alguns, a síntese do EPA e do DHA a partir do ALA não é tão ruim (isso depende dos outros hábitos nutricionais) e aportes importantes em ALA parecem autorizar concentrações “suficientes” em EPA e DHA. As recomendações atuais (aproximadamente 1 g de EPA+DHA e pelo menos 2 g de ALA por dia) evitam as deficiências ou as insuficiências.
NB – Em qual medida é necessário usar complementos de omega-3 (em cápsulas), ou alimentos enriquecidos em omega-3?
ML – Alguns pacientes com fatores de risco (por várias razões) não são capazes (por várias razões) ter aportes suficientes em omega-3 pela modificação da alimentação habitual. A prescrição de cápsulas de óleo pode ser salvadora nesses casos, por exemplo imediatamente após um infarto do miocárdio.
NB – A culinária francesa é ligada a culinária do Mediterrâneo e também a outras tradições. Fala-se muito do paradoxo francês (alimentação rica em gorduras mas pouca agressiva para o sistema cardiovascular). Este paradoxo existe de verdade?
ML – A cozinha francesa é extremamente variada e não é mediterrânea, salvo no Sul da França na zona climática mediterrânea. Basta comparar as tradições culinárias da maioria das regiões francesas com as características “lipídicas” da dieta do Mediterrâneo descritas acima para entender. Portanto, efetivamente, a prevalência das doenças cardiovasculares é relativamente baixa na França, em geral, quando comparamos com os países ocidentais cujos hábitos alimentícios são muitas vezes mais “prudentes” (quer dizer menos suscetíveis de aumentar o colesterol) do que os dos franceses. É o que temos chamado o paradoxo francês.
NB – Como pode se explicar este paradoxo hoje?
ML – A única explicação sólida (fora várias hipóteses interessantes) deste paradoxo é o consumo importante de vinhos pelos franceses, quer dizer uma mistura absolutamente perfeita de etanol e de polifenois.
NB – Na França, o vinho foi recentemente alvo de uma discussão entre oncologistas (que não o aconselham) e cardiologistas, que são favoráveis ao consumo moderado. Qual é a sua opinião?
ML – Esta polêmica é muito artificial, e, de fato, apenas o Instituto Nacional do Câncer (INCA) francês se posicionou sobre este tema, que não é confirmado por fatos comprovados. Na verdade, não há polêmica. Os dados científicos, com o limite que eles são observacionais porque não podemos fazer experiências em longo prazo com álcool, são relativamente claros: o consumo moderado de álcool, principalmente de vinho, não aumenta o risco de cânceres e, ao contrário, reduziria o risco de alguns cânceres, por exemplo, os linfomas.
NB – Aparentemente existiria um mal entendido no que se refere à dieta do Mediterrâneo, que seria uma dieta pouco gorduros
a por alguns, enquanto que a taxa de gordura seria menos importante do que a quantidade e a variedade dos legumes e frutas. Qual é a sua opinião?
ML – A quantidade total de gordura não é um fator determinante na dieta do Mediterrâneo em relação a outros modelos nutricionais. É a qualidade e o tipo de gordura que são fundamentais, como expliquei acima.
NB – Sobre o mesmo assunto, como podemos entender a diferença entre a dieta do Mediterrâneo, que seria excelente para o coração, e dietas mais gordurosas, como a cozinha do Sul Oeste da França, que não seria tão ruim para o coração (paradoxo francês). Como explicar essa diferença?
ML – Existem cozinhas mediterrâneas muito gordurosas (com a da Creta, por exemplo), mas que são protetoras para o coração. Mais uma vez, não é a quantidade total de gorduras que é importante, pelo menos para as doenças cardiovasculares. No que se refere à cozinha bem gordurosa da Gascogne (no Sul Oeste da França), é outro assunto que se junta à outra problemática: é na região do Poitou-Charentes (país da boa manteiga) que se observa a maior esperança de vida na França, próxima a dos japoneses. De novo, estamos em frente das difíceis questões do paradoxo francês…
NB – Qual é a diferença entre a dieta do Mediterrâneo e as dietas japonesas, como a dieta de Okinawa?
ML – Em termos de alimentos e de tradições de consumo, elas são radicalmente diferentes, mas em termos de aportes de nutrimentos (pela avaliação bioquímica da nutrição), elas não são tão distantes. No entanto, faltam ainda estudos comparativos bem documentados.
NB– Isso nos conduz até o problema dos lípides e do colesterol. Você é um crítico da teoria lipídica do infarto. Quais são hoje as explicações possíveis da trombose coronariana?
ML – A trombose (formação de um coágulo obstrutivo em uma artéria) é a causa do infarto. O colesterol não tem nenhum papel na trombose. Uma variedade de fatores nutricionais são potencialmente implicados. A catástrofe acontece no dia que, por sorte, um conjunto de circunstâncias faz com que vários fatores se coordenem para gatilhar a trombose.
NB – O que você pensa da teoria inflamatória?
ML – É um assunto complicado porque tudo depende do que chamamos “inflamação”. O que é conhecido é que os medicamentos anti-inflamatórios aumentam o risco de infarto do miocárdio e de acidente vascular cerebral.
NB – Do papel do diabetes?
ML – Tem que diferenciar o diabetes tipo 1, que é raro, do diabetes de tipo 2 que se desenvolve como uma epidemia no mundo tudo. É o diabetes mesmo (excesso de glicose do sangue, por definição) ou os fatores do estilo de vida que favoreceram este diabetes de tipo 2?
NB – Finalmente, quais são as análises biológicas importantes que testemunham a qualidade da dieta, fora o peso?
ML – O peso não é uma análise biológica. Dito isso, podemos estar com sobrepeso com um risco reduzido, tudo depende do estilo de vida. Todos os exames biológicos que podem avaliar o resultado da dieta do Mediterrâneo, como a dosagem dos ácidos graxos, das vitaminas e dos oligoelementos, são úteis, mas, na verdade, podemos avaliar o risco do paciente com um questionário sobre seus hábitos nutricionais, mas isso exige tempo, e os médicos não têm tempo…
NB – O uso das estatinas é bem controverso. Muitos médicos prescrevem as estatinas como medicamentos de conforto, para poupar o paciente da mudança na dieta e a necessidade de atividade física. Qual é a sua opinião?
ML – Facilidade e fuga das responsabilidades. Os médicos não têm o tempo nem a cultura científica e médica para trabalhar corretamente, incluindo os mais altos níveis das hierarquias universitárias. Eles não têm consciência disso e não há transmissão das exigências da profissão para as novas gerações de médicos.
Para saber mais
– de Lorgeril M, Salen P, Martin J-L, Monjaud I, Delaye J, Mamelle N. Mediterranean diet, traditional risk factors, and the rate of cardiovascular complications after myocardial infarction: final report of the Lyon Diet Heart Study. Circulation 1999;99:779–85.
– de Lorgeril M, Renaud S, Mamelle N, Salen P, Martin J-L, Monjaud I, Guidollet J, Touboul P, Delaye J. Mediterranean alpha-linolenic acid-rich diet in secondary prevention of coronary heart disease. Lancet 1994;143:1454–9.